Edição 64 - Maio de 2013 |
EDITORIAL |
O mês de maio tem um
significado especial
para nós do ITCR:
acontece o Congresso
Brasileiro (anual) de
Terapia por
Contingências de
Reforçamento. É um
acontecimento de grande
significado pela sua
abrangência – recebemos
participantes de todo o
Brasil; pelo seu
pioneirismo – congrega
num único evento o que
tem sido produzido em
TCR; e pela contribuição
que presta à Psicologia
(Comportamental, em
particular) – oferece
uma gama de atividades,
as quais instrumentam a
ação terapêutica, para
estudantes,
profissionais recém
formados e novos adeptos
da área.
A maior fonte de
contribuição científica
– basicamente,
elaborações conceituais
e estudos de casos
clínicos – tem sido o
ITCR, uma vez que nossa
equipe – quase
unanimemente – tem
apresentado trabalhos
com inegável significado
clínico-social. Nosso
Instituto tem
características próprias
de inestimável valor:
prestamos serviços para
a comunidade,
preparamos, através de
vários níveis de Cursos,
alunos e profissionais
para atuarem dentro do
nosso modelo terapêutico
e difundimos
conhecimentos aqui
gerados em Encontros e
Congressos científicos,
Jornadas universitárias,
Cursos de aprimoramento
e de especialização etc.
O Congresso é uma
oportunidade para
prestação de contas. É
ocasião para
sistematizar o que
produzimos e submeter
nossas contribuições à
avaliação séria,
construtiva e confiável
da comunidade científica
e de pares psicólogos
clínicos. Tal abertura à
avaliação de nossos
produtos é a aplicação
sistemática do princípio
fundamental da Análise
do Comportamento: expor
nossos comportamentos
científico-profissionais
à seleção pelas
consequências.
Gostaria de encerrar
este texto com um
comentário que foi
enviado aos
Organizadores do
Congresso por uma colega
– participante e
expositora – a respeito
do evento: “Aposto que
este evento cresce
vertiginosamente; vocês
são exemplos de
verdadeira formação de
analistas do
comportamento.” |
Um abraço,
Hélio José Guilhardi
(CRP: 06/918) |
|
RELEMBRANDO |
“História de
contingências se refere
à interação e à
integração de todas as
contingências de
reforçamento a que a
pessoa foi exposta e
não, exclusivamente,
aquelas às quais foi
exposta num determinado
período de seu
desenvolvimento, na
infância apenas, por
exemplo (a menos que
determinado período seja
o foco de interesse e,
então , isso deve ser
explicitado). Convém
lembrar, o que já foi
exposto por mim em outro
texto, que as
contingências de
reforçamento às quais a
pessoa foi exposta no
passado só são
relevantes enquanto
mantêm suas funções no
presente (neste caso,
não é correto dizer
contingências de
reforçamento passadas ou
do passado, já que são
atuais, operam
funcionalmente no
presente. Tão
simplesmente, começaram
a atuar no passado, mas
mantêm as mesmas funções
atualmente). As
contingências de
reforçamento que atuaram
no passado e perderam as
funções no presente
podem ser relatadas, mas
como tactos verbais
sobre o que ocorreu.
Tornaram-se, mantendo um
conceito mentalista,
conteúdo da memória.” (GUILHARDI,
H. J., 2007) |
|
APRENDENDO COM GRAÇA I |
Pode parecer ingênua a
frase conclusiva do
Calvin... Afinal, ele é
apenas um garoto!
Pare e pense. Quantas
atividades psicológicas
(melhor seria chamá-las
de comportamentais) não
são atribuídas – com a
mesma ingenuidade do
Calvin – ao cérebro:
livre arbítrio,
raciocínio lógico,
desejo, decisão, força
de vontade, caráter...
Serão todos lubrificados
no cérebro? |
|
COTIDIANO |
O CARRO DE LUXO
Hélio José Guilhardi
Ele parou com seu carro
do ano na rampa do posto
de gasolina. Foi trocar
o óleo. Logo puxou
conversa com o
funcionário que
terminava a troca em um
carro ainda suspenso no
alto do braço
hidramático.
— Fui correr na Lagoa.
Corri 10 quilômetros.
Acordo cedo no sábado
para curtir a madrugada.
Vou dar uma volta em
Poços de Caldas. Fim de
semana com estrada
cheia, mas curto a
paisagem da serra... Me
renovo com um passeio
assim! Você “vê” o óleo
do motor e da direção
para mim? Amanhã volto a
tempo de ver o Coringão
contra o Santos... Vamos
afogar o Peixe! Fica
pronto até às dez horas?
Preciso pegar minha
mulher na aula de
Inglês!... Está
estudando um pouco para
nossa viagem para os
Estados Unidos...
O funcionário em
silêncio. Não falou uma
palavra. Aliás, nem
houve oportunidade para
qualquer palavra. Nem
dele, nem minha!
Imaginei o “figura”
diante de um espelho:
— Como sou lindo, rico,
interessante...
O espelho em silêncio!
Calado, o espelho
concorda com tudo o que
dizem diante dele.
O narciso no posto de
gasolina, além de surdo,
às vezes é também mudo:
não falou “bom dia”; nem
se despediu com
“obrigado”! |
PIETRA
Hélio José Guilhardi
As gêmeas, dois anos
recém completados,
brincavam com a mãe,
montando um
quebra-cabeça. Paola
logo se distraiu com
outra atividade e se
afastou. Pietra
permaneceu um pouco
mais.
Hora de guardar o
brinquedo! Pietra parada
ficou observando: a mãe
guardou todas as peças,
fechou a caixa e se
afastou. Pietra pegou o
quebra-cabeça e tentou
tirar a tampa. Alguém
falou: “Deixa a caixa
fechada. Vai bagunçar
tudo pelo chão.”
Pietra fez que não
ouviu. Tentou, tentou e
abriu a caixa. Não
bagunçou nada.
Abaixou-se e foi pegar
uma peça perdida do
quebra-cabeça, debaixo
da mesa. Guardou-a na
caixa, fechou a tampa e
deu-se por satisfeita
com a tarefa cumprida!
Não houve necessidade de
nenhum reforço
arbitrário. Bastou
guardar o quebra-cabeça
com todas peças. Reforço
natural funciona! |
SOBRE O DIA DAS MÃES...
Hélio José Guilhardi
“Meu irmão caçula era
muito ligado a minha
mãe. Éramos em 10: cinco
homens e cinco
mulheres.” Assim falava
minha vizinha. “Um dia,
meu irmão perguntou a
ela:”
— Se você morrer, você
vem me buscar?
— Se eu vier depois de
morta, você não vai ter
medo de mim? (Medo de
almas do outro mundo era
tão comum!)
— Quando eu reconhecer
que é você, saio
correndo e pulo nos seus
braços, completou ele.
Nem precisou dizer o
quanto a amava. |
|
ALÉM DE TERAPEUTA |
Maria Isabel de
Albuquerque Cavalcanti
Franco, a Bela *
Sou professora de inglês
na Cultura Inglesa há
mais de 35 anos. O
inglês sempre me
fascinou. Quando era bem
pequena adorava ouvir
músicas em inglês, que
meus irmãos mais velhos
gostavam, e cantava do
jeito que entendia -
quanta risada quando vim
a descobrir a letra real
das músicas! Fiz
intercâmbio de um ano
pelo American Field
Service (AFS) no Oregon,
EUA, quando tinha 17
anos e minha estadia lá
foi um divisor de águas
na minha vida. Tive uma
experiência riquíssima
que confirmou meu
interesse pelo inglês e
me abriu as portas para
minha outra paixão, a
Psicologia. Uma das
matérias que mais me
empolgou enquanto
estudava nos EUA foi
Psicologia e participava
de todas atividades
oferecidas: sessões de
terapia de grupo,
discussões teóricas,
visitas a instituições e
debates . Comecei a ler
a respeito do campo e a
me interessar.
Quando voltei para o
Brasil já comecei a dar
aulas de inglês em uma
escola em Santo André,
ao mesmo tempo em que
prestava vestibular para
Psicologia na USP. Como
professora, sempre pude
usar os conhecimentos
adquiridos na faculdade
e participar da
realização de sonhos de
muitos alunos: emprego
novo, promoção, viagem
de negócios ou de lazer.
Além disso, fiz amizades
duradouras. Ainda me
emociono com a
facilidade com que as
crianças lidam com os
sons e com a língua e
como se encantam com o
material colorido e os
brinquedos. No ITCR o
armário lotado de
brinquedos também exerce
um fascínio imenso nos
nossos clientinhos.
Gosto muito do som e da
lógica da língua inglesa
e sinto muito prazer
assistindo filmes,
séries, ouvindo músicas,
lendo textos,
conversando e viajando.
Como terapeuta no ITCR
tenho tido oportunidade
de atender faixas
etárias diferentes e dar
vazão ao meu lado
acadêmico atuando como
supervisora presencial
de alunos do curso de
Graduação e online de
alunos do curso de
Especialização em
Análise do
Comportamento. O ITCR
tem me desafiado a
produzir textos
acadêmicos e a cada dia
que passa me sinto mais
apaixonada pelo que
faço. Através do
instituto, além dos
atendimentos, tenho
unido minhas duas
profissões dando aulas
particulares para
pessoas com necessidades
especiais e fazendo
atendimento em inglês a
clientes estrangeiros.
*Bela (CRP 06/6350) é
graduada em Psicologia
pela USP- SP (1977) e
Especialista em Análise
do Comportamento pelo
ITCR- Campinas (2011).
Atua no Instituto desde
2010 |
|
A PALAVRA É SUA |
Valéria Bertoldi Peres*
1) Quando e como você
começou a trabalhar no
ITCR?
Estou no ITCR há nove
anos. Comecei a
trabalhar no ITCR em
novembro de 2004, quando
se iniciaram as
atividades na Rua
Josefina Sarmento, 395.
2) Quantas horas por
semana você trabalha no
ITCR? Trabalha também em
outros lugares? Quais?
Não trabalho em outro
lugar, pelo menos não
como psicóloga! No ITCR
trabalho 30 horas
semanais em atendimento
clínico e sou
supervisora do Curso de
Especialização, tenho um
grupo de supervisão aos
sábados e cinco
supervisionandos online.
3) Porque a Psicologia?
Meu relacionamento com a
Psicologia vem desde a
infância, quando meus
pais aplicavam os
procedimentos da Análise
do Comportamento em mim
e nos meus irmãos,
orientados pelo Prof.
Hélio Guilhardi que
iniciava suas atividades
na clinica juntamente
com o Prof. Luis Otávio
Seixas Queiroz. Desde
então sempre mantive
contato com a Psicologia
e admirava a forma de
trabalho desses dois
grandes Psicoterapeutas.
4) Em que cidade você
mora?
Moro em Campinas, SP.
5) Se você tivesse que
ser outra pessoa, quem
escolheria ser e por
quê?
Não escolheria ser outra
pessoa, apesar dos
desafios que a vida me
colocou, adoro tudo que
construí especialmente
minha família e minha
profissão.
6) Que personalidade
famosa você gostaria de
atender? Conte o porque.
Oswaldo Montenegro, um
músico em busca da
felicidade. Ele diz:
“mudar dói, não mudar
dói mais ainda” – já
está preparado para o
início do processo
terapêutico.
7) Com quais pessoas
você passa mais tempo na
sua semana?
Meus filhos, marido e o
Spoky!
8) Você tem animal de
estimação?
Sim, o Spoky. Um
yorkshire que trabalha
como acompanhante
terapêutico.
9) Nas horas vagas...
Gosto de fazer arte
culinária.
10) Livro ou filme
favorito
Closer – Perto demais.
*Valéria Peres (CRP:
06/33454) é formada em
Psicologia pela
PUC-Campinas (1989) e
especialista em Terapia
por Contingências de
Reforçamento pelo ITCR
Campinas (2005) |
|
GIRO |
Jovens e o desafio do
álcool
"O que eu, pai ou mãe,
devo fazer em relação ao
fato de o meu filho,
menor de idade, já
beber?" Proibir
radicalmente o consumo
em casa e tentar vigiar
100% do tempo o
comportamento dele em
festas e baladas, ou
pensar em alternativas
para educar para o
consumo responsável,
mesmo antes dos 18?
Vamos aos fatos: o
adolescente brasileiro
de hoje já bebeu antes
dos 18. Há poucas
semanas, o Estado trouxe
dados de uma nova
pesquisa. A segunda
edição do Levantamento
Nacional de Álcool e
Drogas da Unifesp, de
2012, ainda não
apresentou os números
finais sobre os jovens
(em fase de análise),
mas em sua versão
anterior, de 2006, já
mostrava tendências bem
claras. O início do
contato com a bebida se
dá de forma precoce, em
torno dos 14 anos e,
após cerca de 6 meses, o
uso se torna regular
para quase um terço dos
jovens: 24% deles bebem
pelo menos uma vez por
mês e quase metade dos
garotos bebe ao menos
três doses.
Em um mundo ideal, os
jovens não beberiam
antes dos 18. Assim,
estariam mais protegidos
dos efeitos nocivos do
álcool sobre um sistema
nervoso ainda em
desenvolvimento. Sabe-se
que quanto mais cedo se
dá o primeiro contato
com a bebida, maiores as
chances de o jovem
evoluir para um padrão
mais complicado de
consumo, como o abuso
(beber muito em um curto
intervalo de tempo) e a
dependência. Isso se dá
tanto pela questões
biológicas quanto pelas
fragilidades emocionais
dessa fase (insegurança,
timidez, autoestima,
entre outras).
Quanto mais tempo o
jovem puder adiar o
contato com álcool,
melhor. Assim, começar a
beber aos 18 é muito
melhor do que aos 13 ou
15. Mas esperar que
todos os jovens, com
base no diálogo ou na
proibição dos pais ou da
lei, deixem de beber é
acreditar em conto de
fadas. Mesmo nos EUA,
onde a idade legal é
mais alta (aos 21) e a
fiscalização mais
severa, uma em cada
quatro latinhas de
cerveja é consumida por
um adolescente.
Texto de Jairo Bouer,
publicado originalmente
no jornal O Estado de S.
Paulo, 28 de abril de
2013, Caderno Metrópole,
pág. A30 |
Ex-ministros da Justiça
defendem fim de penas a
usuários de drogas
A campanha pela
descriminalização do uso
de drogas ganhou o apoio
de sete ex-ministros da
Justiça, que entregam
hoje ao STF (Supremo
Tribunal Federal) um
manifesto defendendo que
não se pode punir
comportamentos
praticados na intimidade
que "não prejudiquem
terceiros".
O documento é assinado
por Nelson Jobim, José
Carlos Dias, Miguel
Reale Júnior, Aloysio
Nunes Filho e José
Gregori --que estiveram
à frente da pasta
durante o governo
Fernando Henrique
Cardoso--, além de Tarso
Genro e Márcio Thomaz
Bastos, que ocuparam o
cargo durante os
mandatos de Luiz Inácio
Lula da Silva.
A manifestação será
enviada ao ministro
Gilmar Mendes, relator
de um recurso sobre o
tema. O processo tem
repercussão geral
reconhecida --apesar de
tratar de um caso
específico, a decisão do
STF terá um efeito
genérico.
"O fracasso da guerra às
drogas baseada na
criminalização do
consumidor revela a
impropriedade das
estratégias até hoje
utilizadas", diz o
manifesto. "Tratar o
usuário como cidadão,
oferecendo-lhe estrutura
de tratamento, por meio
de políticas de redução
de danos, é mais
adequado do que
estigmatizá-lo como
criminoso."
Pela lei brasileira,
usar droga é crime,
embora, desde 2006, não
haja cadeia para os
punidos. O condenado
deixa de ser réu
primário e tem como pena
máxima dez meses de
prestação de serviços
comunitários, além de
multa.
Se o Supremo decidir que
não há crime, o usuário,
em tese, não poderá
receber nem advertência,
a mais branda das
punições previstas na
lei.
Ainda não há prazo para
que o caso seja
analisado pelo Supremo,
mas a expectativa é que
o julgamento ocorra este
ano. Será a primeira vez
em que a corte máxima do
país discutirá o uso de
drogas.
O processo que originou
a discussão se refere a
usuário de maconha, mas
a decisão do STF valerá
a todas as drogas. A
ação que será julgada
pela corte foi movida
pela Defensoria Pública
paulista.
*Texto do repórter
Felipe Seligman,
publicado originalmente
no jornal Folha de S.
Paulo, 16 de abril de
2013, Caderno Cotidiano,
p. C1 |
Viagem sem volta
O suicídio e a batalha
por sua prevenção
Prevista para este ano,
a inclusão de uma
categoria de
comportamentos suicidas
no novo Manual
Diagnóstico e
Estatístico de
Transtornos Mentais, o
chamado DSM 5,
referência na área de
saúde mental em todo o
mundo, pode ajudar os
médicos a quantificar
melhor esse fenômeno, em
especial as tentativas,
cujas taxas podem ser 40
vezes mais altas do que
as dos suicídios
consumados.
- Essa é a opinião do
psiquiatra José Manoel
Bertolote, que acaba de
lançar "O Suicídio e sua
Prevenção" [Unesp, 142
págs., R$ 18]. Ele
afirma, em entrevista à
Folha, que a depressão,
o alcoolismo e a
esquizofrenia são as
três principais causas
por trás das mortes
autoinflingidas.
Estima-se hoje em 1
milhão o número anual de
mortes por suicídio em
todo o mundo. Isso o
coloca como uma das
"três principais causa
de óbitos em
determinadas faixas
etárias de vários países
e em várias regiões do
globo", escreve
Bertolote. No livro, o
psiquiatra traça um
histórico sobre o tema a
respeito do qual já se
debruçaram teólogos,
juristas, filósofos,
sociólogos entre outros,
e analisa, sob o prisma
da saúde pública, suas
causas no Brasil e no
mundo.
Folha - Como o sr. vê a
inclusão da categoria de
comportamentos suicidas
no novo manual de
psiquiatria?
José Manoel Bertolote -
Vejo com bons olhos.
Hoje há boas
estatísticas de mortes
por suicídio para cerca
de dois terços do mundo,
mas não há um registro
centralizado de
tentativas de suicídio.
Se uma pessoa ingere um
veneno e vai parar no
pronto-socorro, o caso é
registrado como
intoxicação; se ela
corta os pulsos, lesão
cortante. A
intencionalidade acaba
nunca sendo registrada.
A inclusão de uma
categoria de
comportamento suicida é
bem-vinda, pois vai
permitir dar uma visão
melhor desse quadro.
Estudos mostram que a
taxa de tentativa de
suicídios chega a ser 40
vezes mais alta que a
taxa de suicídios
consumados.
Como o suicídio se
tornou um assunto da
medicina?
Até cerca de três
séculos atrás, o
suicídio era basicamente
um problema teológico. O
catolicismo considerava
o suicídio um pecado
grave, o islamismo
considera até hoje o
pior pecado, pois é a
destruição da obra
divina. Havia também o
interesse de filósofos
e, na Inglaterra e em
vários outros países, o
suicídio era considerado
uma morte indigna. O
direito o tratava como
um crime contra o
Estado.
Foi a partir dos séculos
17 e 18 que médicos
passaram a se interessar
pela questão do suicídio
e a considerar que o
suicídio tinha uma
relação estreita com a
saúde, porque eles
julgavam que todo
suicídio era um ato de
loucura. E isso foi
ganhando adesão com o
tempo. No século 20,
consolidou-se a ideia de
que o suicídio é um
problema de saúde e,
sobretudo, de saúde
pública.
Há relação entre
suicídio e doença?
O suicídio, em primeiro
lugar, não é uma doença.
Na perspectiva da saúde
pública, é um fenômeno
social de distribuição
irregular na sociedade.
Mas há estudos em todo o
mundo que mostram que,
por trás de grande parte
das mortes por suicídio,
existem doenças.
A maioria dessas doenças
são mentais, mas há
também uma grande
associação entre
suicídio e doenças
incuráveis e dolorosas.
A mortalidade de
portadores de HIV por
suicídio, por exemplo,
caiu muito depois do
advento do coquetel de
drogas, quando ela
deixou de ser essa
doença mortal. As
doenças mais associadas
ao suicídio são a
depressão, o alcoolismo
e, um pouco atrás, a
esquizofrenia.
Quais são os limites da
prevenção do suicídio?
Não acredito que o
suicídio possa ser
erradicado, pois é um
fenômeno humano que
existe desde sempre. Há,
por exemplo, uma
porcentagem de suicídios
por trás da qual, por
mais se investigue, não
se encontra uma doença
ou causa clara.
Durkheim, em sua
tipologia de suicídios,
fala do suicídio
altruísta [situação em
que um indivíduo está
tão conectado a sua
comunidade, que abdica
de sua individualidade,
acreditando que sua
morte pode trazer
benefícios para a
sociedade]. Como é que
se vai prevenir isso?
Não há o menor sentido.
Não é disso que a
prevenção do suicídio se
ocupa. A prevenção se
ocupa dos casos
considerados evitáveis,
porque decorrentes de um
fator que poderia ser
removido [como o
alcoolismo].
Um dado importante e
comprovado é que a
maioria das pessoas que
tentam o suicídio não
quer morrer. São pessoas
que querem mudar uma
situação, escapar de um
problema e, às vezes, a
situação é tão
tantalizante que a
pessoa não enxerga outra
saída. Há estudos com
pessoas que fizeram uma
tentativa de suicídio
por um método muito
letal e estão próximas
de morrer. Elas são
entrevistadas nesse
momento. A imensa
maioria fica desesperada
quando percebe que vai
morrer e que é
irreversível.
Pode-se falar de um luto
diferente para os
parentes de um suicida?
O luto de uma perda
inesperada, sobretudo
por uma forma
inaceitável, é um luto
mais complicado que o
luto "normal". O
suicídio sempre desperta
nos que ficam no mínimo
dois sentimentos: culpa
e raiva. Isso causa um
mal-estar tão grande que
chega a ser um fator de
risco de suicídio. São
relativamente comuns
suicídios em famílias em
que um membro acaba de
se suicidar.
Há um importante
movimento internacional
de sobreviventes,
chamado Survivors,
fundado por um casal
americano que perdeu sua
única filha pelo
suicídio. Eles se
aproximam de famílias em
luto para conversar,
compartilhar
experiências. O
resultado é o
desenvolvimento de uma
solidariedade
intragrupal e o
sentimento de
solidariedade e
responsabilidade pelos
outros.
Texto publicado
originalmente no jornal
Folha de S. Paulo,
caderno Ilustríssima, p.
6, em 14 de abril de
2013 |
|
A fera interior
O atentado de Boston
suscitou uma série de
questionamentos a
respeito do perfil
psicológico de
terroristas...
Transcrevemos a seguir
trecho do depoimento de
Luiz Alfredo
Garcia-Roza, escritor,
autor de livros de
ficção policial, entre
eles “O Silêncio da
Chuva”, extraído do
jornal O Estado de S.
Paulo, de 21 de abril de
2013.
"Se um ataque terrorista
é necessariamente
produto de uma mente
doentia? Essa é uma
questão delicada. O que
seria 'uma mente
doentia'? Invertendo a
pergunta: só uma mente
doentia seria capaz de
tamanha maldade? Uma
mente sadia é incapaz de
crueldade? O Mal é uma
doença e a maldade o seu
sintoma? Durante séculos
nos ensinaram que o
homem é essencialmente
bom. Mesmo porque, para
grande parte do mundo
ocidental, ele foi feito
à imagem e semelhança de
Deus, seu criador.
Crescemos acreditando
que o mundo continha
nele próprio o Bem, e
que o homem como parte
desse mundo reproduzia
na sua interioridade o
Bem inerente ao mundo.
Imaginemos um grande
círculo no interior do
qual colocamos o Bem. O
Mal 'habitaria' o
exterior desse círculo,
seria o outro, o
além-muros, o
além-fronteiras, a
escuridão infinita, o
silêncio eterno, a
exterioridade pura ou o
puro outro. Seria
representado no nosso
imaginário como o
estranho, o estrangeiro,
a peste, o monstro
assassino. O difícil é
admitirmos que o Mal e o
Bem possam ambos ser
frutos do próprio homem:
não há o Bem e o Mal,
mas apenas o bom e o
mau, ambos humanos,
demasiadamente humanos.
A partir da eliminação
dessa linha que
circunscreve, separa e
isola o Bem do Mal, a
fera e o assassino
passam a habitar a nossa
própria interioridade –
assim como habita o
alívio quando saem
milhares de policiais à
caça de um suspeito para
evidentemente matá-lo. A
pessoa nunca admitiria
que houvesse um
fuzilamento público. Mas
aí vai descobrindo que
aquilo é confortável
porque ela faria aquilo
daquele jeito, mesmo sem
consciência". |
Darwin e a prática da
'Salami Science'
Em 1985, ouvi pela
primeira vez no
Laboratório de Biologia
Molecular a expressão
"Salami Science". Um de
nós estava com uma pilha
de trabalhos científicos
quando Max Perutz se
aproximou. Um jovem
disse que estava lendo
trabalhos de um famoso
cientista dos EUA.
Perutz olhou a pilha e
murmurou: "Salami
Science, espero que não
chegue aqui". Mas a
praga se espalhou pelo
mundo e agora assola a
comunidade científica
brasileira.
"Salami Science" é a
prática de fatiar uma
única descoberta, como
um salame, para
publicá-la no maior
número possível de
artigos científicos. O
cientista aumenta seu
currículo e cria a
impressão de que é muito
produtivo. O leitor é
forçado a juntar as
fatias para entender o
todo. As revistas ficam
abarrotadas. E avaliar
um cientista fica mais
difícil. Apesar disso, a
"Salami Science" se
espalhou, induzido pela
busca obsessiva de um
método quantitativo
capaz de avaliar a
produção acadêmica.
No Laboratório de
Biologia Molecular,
nossos ídolos eram os
cinco prêmios Nobel do
prédio. Publicar muitos
artigos indicava falta
de rigor intelectual.
Eles valorizavam a
capacidade de criar uma
maneira engenhosa para
destrinchar um problema
importante. Aprendíamos
que o objetivo era
desvendar os mistérios
da natureza. Publicar um
artigo era consequência
de um trabalho
financiado com dinheiro
público, servia para
comunicar a nova
descoberta. O trabalho
deveria ser simples,
claro e didático. O
exemplo a ser seguido
eram as duas páginas em
que Watson e Crick
descreveram a estrutura
do DNA. Você se tornaria
um cientista de respeito
se o esforço de uma vida
pudesse ser resumido em
uma frase: Ele
descobriu... Os três
pontinhos teriam de ser
uma ou duas palavras: a
estrutura do DNA (Watson
e Crick), a estrutura
das proteínas (Max
Perutz), a teoria da
Relatividade (Einstein).
Sabíamos que poucos
chegariam lá, mas o
importante era ter
certeza de que havíamos
gasto a vida atrás de
algo importante. (...)
Mas o que Darwin tem a
ver com isso? Foi ele
que mostrou que uma das
características que
facilitam a
sobrevivência é a
capacidade de se adaptar
aos ambientes. E os
cientistas são animais
como qualquer outro ser
humano. Se a regra exige
aumentar o número de
trabalhos publicados,
vou praticar "Salami
Science". É necessário
ser muito citado? Sem
problema, minhas fatias
de salame vão citar umas
às outras e vou pedir a
amigos que me citem. Em
troca, garanto que vou
citá-los. As revistas
precisam de muitas
citações? Basta pedir
aos autores que citem
artigos da própria
revista. E, aos poucos,
o objetivo da ciência
deixa de ser entender a
natureza e passa a ser
publicar e ser citado.
Se o trabalho é medíocre
ou genial, pouco
importa. Mas a ciência
brasileira vai bem, o
número de mestres
aumenta, o de trabalhos
cresce, assim como as
citações. E a cada dia
ficamos mais longe de
ter cientistas que
possam ser descritos em
uma única frase: Ele
descobriu...
*Texto de Fernando
Reinach, publicado
originalmente no jornal
O Estado de S. Paulo,
caderno Metrópole, p.
A35, em 27 de abril de
2013. |
|
Bombardeio Impessoal
O caderno Aliás, de O
Estado de S. Paulo, de
12 de maio de 2013, p.
E9, no artigo Bombardeio
Impessoal, de Kenneth
Serbin, apresenta um
exemplo dramático do
papel do controle de
estímulos sobre
comportamento humano.
Transcrevemos trechos
mais significativos do
texto:
“Em 1970, em seu
best-seller The Pursuit
of Loneliness: American
Culture at the Breaking
Point (publicado no
Brasil como A Busca da
Solidão), o sociólogo
Philip Slater
identificou essa
tendência e sua relação
com a guerra.”
Slater descreveu a
maneira como pilotos de
bombardeiros americanos
no Vietnã praticavam a
"violência à distância".
"Bombardeiros B-52,
voando de Guam, a 4 mil
quilômetros de
distância, ou da
Tailândia, largando
bombas de uma altura de
12 mil metros para que
não fossem vistos nem
ouvidos do chão, podiam
arrasar um vale
inteiro", escreveu.
"Voar muito acima de um
alvo impessoal e apertar
alguns botões para
transformar 130 km² num
mar de chamas é menos
traumático para o
americano comum de
classe média do que
infligir um ferimento
superficial de baioneta
a um único soldado. O
aviador está protegido
do contato íntimo com as
vítimas de suas
mutilações. Ele não vê
mulheres e crianças
sendo horrivelmente
queimadas até a morte -
o que faz com que elas
nada signifiquem para
ele."
(...)
“O sistema de defesa
nacional continua a
proteger pessoas das
atrocidades da guerra
com a mais recente
inovação em 'violência à
distância': os aviões
não tripulados, drones.”
(...)
“Como os bombardeiros do
Vietnã, os operadores de
drones executam
burocraticamente as
ordens de matar sem
noção da dor e da
destruição causadas.” |
|
TOME NOTA |
03.05
– Aula da Dra. Meire
Soldera, do ambulatório
de AIDS/DST da
Prefeitura Municipal de
Campinas, sobre o tema
“Álcool e Outras
Drogas”, no Curso de
Especialização.
04.05
– Aula da Psicoterapeuta
Thaís Barros Rocha, do
ITCR-Campinas, sobre o
tema “Avaliação
Comportamental:
déficits, excessos e
reservas”, no
Aprimoramento em TCR com
Crianças.
04.05
– Participação do Prof.
Hélio José Guilhardi, do
ITCR-Campinas, na
atividade DIÁLOGOS
COMPORTAMENTAIS, do
Instituto Innove de
Londrina – PR.
03 e 04.05
– Visita ao ITCR dos
alunos da PUC-Minas
(Poços de Caldas),
acompanhados da Profª
Regiane Quinteiro.
11.05
– Aula da Dra. Juliana
Godoi Fialho, sobre o
tema “Como fazer
registros e gráficos com
os dados da Análise
Funcional”, no Curso de
Intervenção
Comportamental com
Pessoas com
Desenvolvimento Atípico.
17 e 18.05
– II CONGRESSO
BRASILEIRO DE TERAPIA
POR CONTINGÊNCIAS DE
REFORÇAMENTO E ENCONTRO
DE TERAPEUTAS
COMPORTAMENTAIS.
21.05
– Marília Zampieri
(ITCR-Campinas)
participará da Feira de
Profissões, do Colégio
Beneditino de Vinhedo –
SP.
25.05
– Aula da Dra. Carolina
Vieira, sobre o tema
“Procedimentos para
minimizar comportamentos
disruptivos e
socialmente
inadequados”, no Curso
de Intervenção
Comportamental com
Pessoas com
Desenvolvimento Atípico. |
|
COMPREENDENDO A TCR - I |
Especialista em TCR, a
Psicóloga e Diretora do
ITCR, Noreen Aguirre,
concedeu entrevista à
Revista Metrópole, do
jornal Correio Popular,
sobre a
Síndrome do Ninho Vazio.
A matéria será publicada
na revista em breve.
Aqui no Sinal Verde você
confere a íntegra do
material elaborado pela
Noreen.
O que exatamente
caracteriza a síndrome
do ninho vazio? Pode
chegar a ser uma
depressão?
Quando falamos em
síndrome, estamos nos
referindo a uma série de
sintomas que aparecem em
conjunto. Não
necessariamente a pessoa
relata todos os
sintomas, mas alguns
dentre aqueles
possíveis. O que se
convencionou chamar de
síndrome do ninho vazio
são alterações
indesejadas nos
comportamentos e
sentimentos dos pais,
quando os filhos saem de
casa, seja para estudar
fora, ou quando se
casam, ou quando se
mudam para um local
distante etc. Tais
alterações, ao invés de
adaptativas, trazem
sofrimento para a
pessoa. A depressão é um
dos sintomas possíveis
(e frequentes) na
síndrome. Além disso, a
pessoa pode se tornar
extremamente queixosa;
não obtém satisfação com
as ocorrências normais
do dia a dia; se isola
ou busca contato com os
outros apenas para
deixar claro o estado de
solidão e abandono em
que acha que se
encontra; apresenta
inúmeras queixas sobre
dores e doenças etc.
As mulheres que mais
tendem a sofrer com ela
são aquelas que não
trabalham e viveram para
os filhos? As modernas,
que trabalham fora,
tendem a sofrer menos
quando os filhos saem de
casa?
Não necessariamente. Os
sentimentos independem
do fato de a pessoa ter
trabalhado fora ou ter
se dedicado ao lar
durante a criação e
educação dos filhos até
a idade adulta. O
importante é que, não
obstante seu estilo de
vida, ela tenha mantido
interesses próprios,
contatos com amigos,
tenha se mantido
atualizada com o que
ocorre fora do ambiente
doméstico.
Existe um perfil de
pessoas mais propensas a
ter a síndrome?
Podemos dizer que a
pessoa que, mesmo no
período em que os filhos
ainda estavam em casa,
não obtinha prazer e
satisfação pessoal a não
ser através de situações
que envolvessem os
filhos, terá maior
propensão a relatar
sentimentos indesejados
quando seu acesso ou sua
influência sobre eles se
reduzir ou cessar.
Podemos considerar
também que, quando a
pessoa vive sozinha, por
ser divorciada ou viúva,
já está exposta a uma
situação de privação de
contato social que, caso
não seja bem
administrada, pode
aumentar a probabilidade
de ocorrência de
sintomas da síndrome.
Outra questão a ser
analisada é se a pessoa
tem sentimentos de culpa
por achar que deixou de
fazer algo pelos filhos
e... agora é tarde
demais!
Quanto tempo ela pode
durar? E como se livrar
dela?
Não dá para estabelecer
um prazo. Vai depender
das oportunidades
disponíveis e do
envolvimento da pessoa
para mudar sua rotina e
reverter tais
sentimentos, do apoio de
amigos e familiares etc.
Pode ser necessário o
encaminhamento a um
tratamento psicológico
e, em alguns casos, até
tratamento medicamentoso
orientado por um
psiquiatra.
Como os filhos que
saíram de casa podem
ajudar a mãe sair desta
condição?
De várias maneiras:
mantendo contato
(atualmente, além do
telefone, há recursos
como o Skype, que dão
maior sensação de
proximidade. Além disso,
caso os pais não saibam
utilizar tais recursos,
o aprendizado acabará
também se constituindo
numa ferramenta para se
livrar da síndrome),
demonstrando que
reconhecem a influência
(quando positiva) dos
pais em suas próprias
vidas (profissional,
familiar), se
interessando pelas
atividades que os pais
vêm desenvolvendo...
Os homens também podem
sofrer com a síndrome do
ninho vazio? Em mesma
proporção que as
mulheres?
Os sintomas relatados
são mais comuns em
mulheres, mas ocorrem
também com os homens,
principalmente se já são
aposentados e não têm
uma ocupação fixa, ou se
vivem sozinhos.
É possível fazer algo
para que a saída dos
filhos de casa seja
menos dolorida?
A saída dos filhos de
casa não deveria ser
experienciada como algo
doloroso. Afinal, é o
momento em que estão
começando a assumir o
controle sobre suas
próprias vidas, e os
pais podem encará-lo
como uma demonstração de
sucesso dos filhos e de
retorno (na forma de
admiração, orgulho,
sensação de dever bem
cumprido) de toda a
dedicação e investimento
(tanto material, como
afetivo) dispensados aos
filhos. Além disso, os
pais precisam ter claro
que não é uma situação
de rompimento, mas pode
ser, sim, de
desenvolvimento.
A preparação para tal
momento também é muito
importante: reconhecer
que é inevitável e
desejável, e manter-se
ativo e envolvido com
algum interesse que não
envolva,
necessariamente, os
filhos. Pode ser ocasião
para retomar interesses
temporariamente deixados
de lado (fazer um curso,
aprender um idioma,
dedicar-se a um novo
hobby, viajar). Costumo
dizer que para manter-se
emocionalmente saudável
é preciso estar
“inventando moda”, ou
seja, manter-se aberto a
algo novo. |
COMPREENDENDO A TCR - II |
ATENÇÃO SÓCIO-AFETIVA E
ATENÇÃO SOCIAL
Hélio José Guilhardi
É comum argumentar, e
até demonstrar
cientificamente, que a
atenção mantém e amplia
repertório de
comportamentos
indesejados. A atenção,
inclusive, tem função de
reforço (generalizado,
condicionado) positivo,
quer seja expressa de
uma forma acolhedora
(sorrisos, elogios,
toques físicos,
aprovação, olhares,
acenos de cabeça etc.),
quer seja apresentada de
forma recriminatória
(repreensões verbais,
reprovações, críticas,
beliscões, toques
bruscos, safanões,
gritos, palavrões etc.).
Em seu trabalho clínico,
o terapeuta encontra
muitos exemplos de
situações como as
alinhavadas no parágrafo
acima e, às vezes, é
desafiado por algumas
questões – como as duas
que se seguem – por
pessoas pouco
familiarizadas com os
conceitos e
procedimentos
comportamentais:
1. Se o comportamento
indesejado produz
atenção, por que ele não
se enfraquece por
saciação (da atenção que
produz)?
2. Se a pessoa está
carente de atenção, por
que, ao recebê-la, a
pessoa não passa a se
sentir bem – afinal,
conseguiu aquilo de que
está privada – e a se
relacionar de forma
harmoniosa com seu
ambiente sócio-afetivo?
Em primeiro lugar,
atenção não é um reforço
primário, como água,
comida, sexo, calor
etc., mas um reforço
condicionado (aprendido,
portanto) generalizado
positivo. Atenção não é
um comportamento único,
mas uma classe ampla de
comportamentos, tendo
todos eles a função de
reforço positivo,
adquirida de maneira
particular para cada
indivíduo, a partir da
história de
contingências de
reforçamento a que ele
foi exposto. O termo
“generalizado” informa
que a função reforçadora
da atenção foi adquirida
por associação com
inúmeros outros reforços
e, como tal, sua função
reforçadora não depende
de nenhuma privação
específica e individual.
A pessoa, pode-se dizer,
sempre estará privada de
alguma classe de
reforços e o reforço
generalizado tem,
portanto, garantida sua
função durante todo o
tempo. Um exemplo
didático de tal reforço
é o dinheiro: ele
adquire a função de
instrumento que permite
acesso a um sem número
de itens que têm função
reforçadora para as
pessoas. É raro
encontrar alguém que se
sinta saciado com o
dinheiro que tem!
Concluo, então, que as
pessoas não se saciam
quando produzem reforço
positivo generalizado.
Em segundo lugar, a
atenção é
disponibilizada em
diferentes esquemas de
reforçamento
intermitentes (razão e
intervalo variáveis, na
maioria das situações),
o que produz maior
resistência à extinção e
maior tolerância à
frustração. O poder de
esquemas intermitentes,
de manter os
comportamentos que
produzem determinada
consequência, em parte
explica a manutenção dos
padrões comportamentais,
insensíveis à saciação
(em particular quando a
consequência não tem a
propriedade de
saciar...) .
Um terceiro argumento
nos dirige a uma
avaliação do repertório
comportamental mais
amplo da pessoa. Em
outras palavras, um
indivíduo pode obter
atenção emitindo
comportamentos
indesejados porque são
esses comportamentos
exatamente os que
produzem atenção e, como
tal, são os selecionados
naquele determinado
contexto social (o outro
que libera a atenção é
mais sensível a
contingências aversivas;
nota e reage a
comportamentos que lhe
são aversivos - se
comporta por
reforçamento negativo –
e coloca em extinção
comportamentos que não
lhe são aversivos). Se o
indivíduo tem repertório
comportamental restrito,
basicamente
comportamentos
indesejados que produzem
atenção negativa, então
sua possibilidade de se
comportar se restringe
às classes
comportamentais
indesejadas. Se, por
outro lado, a pessoa tem
repertório
comportamental desejado,
as possibilidades de
apresentar variabilidade
e substituir
comportamento indesejado
por desejado e, desta
forma, produzir atenção,
são imensas. Ou seja, as
interações interpessoais
podem se enriquecer
(desde que o ambiente
responda sob controle da
emissão de
comportamentos
desejados) e se
caracterizar por uma
ampla gama de
variabilidade
comportamental em que se
mesclam comportamentos
desejados e indesejados,
com predominância –
deseja-se que assim seja
– de padrões
comportamentais
desejados naquele dado
grupo social. Em suma,
quando a pessoa tem, em
seu repertório
comportamental, as duas
classes de respostas,
desejadas e indesejadas,
a atenção pode vir a
privilegiar a ocorrência
de comportamentos
desejados. Alguém poderá
perguntar: mesmo quando
inicialmente a atenção é
dada contingente a
comportamento
indesejado? A resposta é
sim, embora possa
parecer, à primeira
vista, um efeito
paradoxal. A atenção,
neste caso, pode
adquirir a função de SD,
ou seja, ocasião em que,
caso as respostas
adequadas sejam
emitidas, então serão
consequenciadas por
atenção. Pode,
adicionalmente, produzir
um estado corporal de
bem-estar, que assume a
função de operação
motivacional, a qual
aumenta a probabilidade
de emissão da classe de
comportamentos
desejados. Finalmente, a
atenção pode gerar,
naquele que se comporta
“mal”, sentimentos de
culpa em relação ao
outro que libera o
reforço generalizado, e
esta contingência de
reforçamento complexa
evoca comportamento de
fuga-esquiva, qual seja,
respostas desejadas.
Em quarto lugar,
gostaria de fazer uma
distinção entre atenção
com amor (atenção
sócio-afetiva) e atenção
sem amor (atenção
social). Os termos entre
parênteses são
arbitrários e são
propostos com a
finalidade de destacar
que a atenção presente
numa interação social
pode ser desprovida de
afeto. Quando
determinado
comportamento (mesmo
aquele denominado
indesejado) produz
atenção sócio-afetiva,
ocorrem dois fenômenos
comportamentais
produzidos pelo reforço
positivo generalizado
carregado de afeto:
fortalecimento do
comportamento que o
produz e sentimentos de
bem-estar, de
tranquilidade, de
satisfação, de
felicidade etc. A pessoa
inundada por tais
sentimentos relaxa e
diminui (ainda que
temporariamente) a
emissão de
comportamentos que
poderiam ser rotulados
de agitação, de
atividade (ou
hiperatividade). É como
se houvesse uma saciação
de atenção... Ao mesmo
tempo, aumenta a
probabilidade de emissão
de comportamentos
desejados, que se
expressam na forma de
quietude (menor
agitação), cooperação,
delicadeza etc. Disto
tudo resulta – num
ambiente social
diferencialmente
sensível às duas
diferentes classes
comportamentais – uma
maior probabilidade de
reforçamento de
comportamentos desejados
(e, concomitantemente,
extinção de
comportamentos
indesejados), os quais,
se forem fortalecidos,
resultarão em
enfraquecimento na
emissão dos indesejados,
por incompatibilidade
funcional.
O mesmo não acontece
quando a atenção é
apenas social. Ocorre
fortalecimento da classe
de comportamentos que a
produzem, mas os
sentimentos gerados são
de alívio, não de
bem-estar, não de
satisfação, não de
tranquilidade... Como
tal, comportamentos da
classe dos indesejados
continuam sendo
emitidos, aumenta a
variabilidade
comportamental dentro
desta classe de
respostas (ocorrem
agitação e
hiperatividade) e os
sentimentos de alívio
são alternados com
sentimento de ansiedade,
insegurança, além de a
carência afetiva não se
esvair. A atenção social
não supre o afeto! Há
menor probabilidade de
emissão de
comportamentos
desejados, mesmo que
façam parte do
repertório da pessoa (o
ambiente não
disponibiliza SDs que os
evoquem) e surgem
padrões de comportamento
de antagonismo, rebeldia
etc. Uma metáfora
facilitará a compreensão
do exposto. O reforço
generalizado positivo
exclusivamente social
equivale ao uso de um
adoçante dietético.
Adoça, mas não alimenta.
A atenção sócio-afetiva
é como o açúcar: adoça e
nutre. |
|
ITCR RESPONDE |
Perguntas enviadas pela
psicóloga Deyse Aline
Tem Pass, de Toledo, PR.
Oi professor Hélio, tudo
bem? Gostaria de tirar
algumas dúvidas que
surgiram quando assisti
algumas gravações de
estudos de caso.
1) Você disse que a
autoestima pode ser
desenvolvida ou perdida
em qualquer momento da
vida. E a autoconfiança,
também pode ser perdida?
Hélio José Guilhardi:
Qualquer sentimento é
produto de contingências
de reforçamento. Como
tal, pode ser instalado,
desde que manejadas as
contingências de
reforçamento –
corretamente
identificadas como
determinantes de dado
sentimento – na direção
apropriada. O fato de
ser possível não
significa que seja
fácil! Desta maneira,
podemos desenvolver
sentimentos de
autoestima num contexto
sócio-afetivo acolhedor.
Inversamente, uma pessoa
exposta a condições de
interações negativas,
destrutivas, coercitivas
etc. pode deteriorar sua
autoestima. Nada é
irreversível, nem
inevitável. No entanto,
os sentimentos não são
regidos por força de
vontade; não se alteram
aleatoriamente: são
desenvolvidos ou
enfraquecidos segundo
leis regulares e
conhecidas, que regem
comportamentos e
sentimentos humanos. O
que se disse sobre o
sentimento de
autoestima, do ponto de
vista conceitual, também
se aplica ao sentimento
de autoconfiança.
2) Pode-se supor que uma
pessoa que tem mais
autoconfiança por
consequências negativas
tem baixa autoestima?
Hélio José Guilhardi:
Em geral, sim.
Reforçamento negativo,
que instala
autoconfiança, instala
também ansiedade,
preocupação, medos,
fobias e outros
sentimentos negativos
que enfraquecem ou são
incompatíveis com
sentimento de
autoestima. O
desenvolvimento pleno -
comportamental e
emocionalmente falando –
ocorre quando prevalece
o contato da pessoa com
contingências de
reforçamento positivas.
Temos que reconhecer que
não há possibilidade de
poupar alguém de
conviver com
contingências
coercitivas. É difícil
falar em desenvolvimento
de autoestima sob
condições sociais
aversivas; pode-se,
porém, reconhecer o
desenvolvimento de
autoconfiança sob
condições coercitivas.
Para entender mais, leia
os textos indicados
abaixo, também da
autoria de Hélio José
Guilhardi, disponíveis
na seção Textos sobre
Terapia por
Contingências de
Reforçamento, do site
www.itcrcampinas.com.br)
•
AUTO-ESTIMA,
AUTOCONFIANÇA E
RESPONSABILIDADE
•
AUTO-ESTIMA E
AUTOCONFIANÇA SÃO
METÁFORAS, NÃO CAUSAS |
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