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Volume 53 - 16/08/11

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Quando o comportamento verbal é apenas verbal, como fazer para que a pessoa passe a discriminar que o que ela diz é da boca pra fora e como trabalhar isso depois para que o comportamento verbal passe a fazer parte de seus repertórios diários? (pergunta de Cuiabá – MT)

           “Falar só por falar” ou “falar da boca pra fora” dá a ideia de que o comportamento verbal é divergente do não verbal; a pessoa fala uma coisa e faz outra – ou deixa de fazer o que havia falado. Neste caso, o comportamento verbal descreve algo que não condiz com a realidade (não é um tato apropriado). Uma possível explicação para essa discrepância é que o comportamento verbal está sendo mantido por reforços generalizados apresentados pelo ouvinte. O estímulo reforçador promoverá uma elevação na frequência da emissão do relato verbal, o qual passa a ocorrer não diante de algo que aconteceu na realidade, mas na ausência das circunstâncias sob as quais é usualmente reforçado. Ou seja, a realidade é distorcida através da fala. Skinner (1957) denomina esse operante verbal de tato distorcido. Para exemplificar: uma criança, privada de atenção dos amigos, ao ganhar um presente dos pais, conta para os colegas e estes demonstram muito interesse, dizendo que gostariam de ter um igual. A criança passa a relatar aos colegas que ganhou presentes maravilhosos, exagerando nas suas qualidades, mesmo quando isso não aconteceu de fato.

            Tatos distorcidos podem ocorrer também em situações em que haja o uso do controle aversivo, com função de fuga-esquiva. No caso, o indivíduo relata que emitiu determinado comportamento e é punido. Entretanto, os efeitos da estimulação aversiva recaem muito mais sobre o comportamento de relatar do que sobre o comportamento relatado em função da temporalidade (o estímulo aversivo é temporalmente mais próximo do relato do que do comportamento relatado). Assim, a pessoa continua a emitir o comportamento, mas não diz que o emitiu ou diz que emitiu outro comportamento diferente daquele que, de fato, havia emitido. Como exemplo, podemos imaginar um marido que chega em casa mais tarde do que o habitual  e, quando a esposa pergunta onde ele estava, fala que foi com os amigos para um bar. Nessa ocasião, a esposa briga com ele. O marido passa, a partir daí, a evitar brigas com a esposa relatando que ficou até tarde no trabalho enquanto, na verdade, continuava a sair com os amigos para o bar.

            Vimos, então, que “falar só por falar” pode ocorrer tanto em uma contingência de reforço positivo quanto em contingências coercitivas. Em indivíduos que apresentam esse comportamento em excesso, constituindo-se um padrão de comportamento, podem ocorrer prejuízos ao próprio indivíduo e a pessoas de seu convívio. Como modificar esse repertório e promover a generalização?

            O primeiro passo seria identificar se o relato condiz ou não com a realidade, se é ou não um tato distorcido. Quando já conhecemos melhor o padrão comportamental da pessoa e de quem convive com ela, fica mais fácil identificar, pois sabemos que certos comportamentos têm maior ou menor probabilidade de ocorrer. Através de perguntas, é possível perceber contradições no relato do cliente e, nesse caso, confirmar a hipótese de que aquele relato era um tato distorcido, ou, do contrário, refutá-la. Tendo clareza dessa análise, alguns procedimentos podem ser adotados para modificar esse comportamento.

            Utilizando o reforçamento positivo, o terapeuta poderia reforçar tatos puros emitidos pelo cliente. Tal procedimento é extremamente útil quando objetivo é aumentar o repertório verbal de tatos puros e reduzir os tatos distorcidos. Além disso, quando o cliente emitisse tatos distorcidos, seria importante que o terapeuta apontasse as inconsistências do relato do cliente de forma amena, fornecendo Sd’s para a emissão de comportamentos adequados (tatos puros). Realizar essa análise com o cliente ajuda-o no autoconhecimento do seu repertório comportamental e das consequências da emissão dos diferentes operantes verbais e na discriminação entre tatos puros e distorcidos. Para visualizar melhor, imaginemos uma criança que perde para o terapeuta no jogo e fala que jogou melhor que este ou venceu. Nesta situação, poder-se-ia reconstituir com o cliente todo o percurso da partida (quem começou jogando, se um começou ganhando e depois perdeu, etc.). Caso o cliente contasse o que realmente havia acontecido, o terapeuta o elogiaria, dizendo o quão boa era a memória dele e o quanto ele havia prestado atenção no jogo para contar os detalhes sobre a partida, até que ele dissesse que havia perdido na partida.

            A instalação de um tato puro exige, por parte da comunidade verbal, a identificação do contexto em que a resposta verbal ocorreu. Em outras palavras, o agente verbal precisa, ele mesmo, se certificar de que o comportamento verbal é um tato puro ou distorcido para aplicar as consequências apropriadas ou aplicar contingências de reforçamento adequadas. Entenda-se que há necessidade de o agente verbal se comprometer ativamente com o falante. Assim, por exemplo, se o filho diz: “entendi o texto de História”, é necessário que o ouvinte conheça o texto em questão e faça perguntas sobre o conteúdo lido a fim de se certificar que o filho realmente entendeu o texto (ou não).

            Por fim, a generalização proporciona a manutenção de comportamentos adequados no ambiente natural. Pensando no caso da criança, descrito anteriormente, o terapeuta poderia pedir à criança que contasse aos pais o que havia acontecido durante a sessão. Se ela dissesse novamente que havia ganhado no jogo, o terapeuta poderia dizer: “Hum... acho que agora sua memória deu uma embaralhada heim! Vamos relembrar: quem começou jogando? Quantos pontos eu tinha no começo? E você? E no final? Então, quem ganhou?” Caso o cliente dissesse que o terapeuta havia vencido, o terapeuta buscaria formas de reforçar o relato, como em: “Nossa! Que menino esperto! Falou tudo certinho! Estão vendo, pais? Eu fico boba com a memória dele”. O cliente passaria, então, a emitir tatos puros não somente na presença do terapeuta, mas também na presença dos pais.

 

Carina Paiva Charpinel
Cursando Especialização em Terapia por Contingências de Reforçamento – ITCR – Campinas – SP
Atua em consultório particular em Vitória - ES

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Estou escrevendo minha monografia para conclusão de curso, o tema fala a respeito de mulheres vítimas de violência doméstica, o estudo tem como principal objetivo discutir sobre os motivos que levam estas mulheres a retirarem a queixa alguns dias após terem dado entrada a um Boletim de Ocorrência na delegacia da mulher. Partindo deste ponto, gostaria de saber de que forma a Análise Comportamental pode estar me ajudando a desenvolver a minha pesquisa, esta é a teoria que eu gosto e que considero eficiente, se possível me mandem sugestões de livros ou artigos referentes ao tema da minha pesquisa. Estou precisando da orientação de vocês. (Jolanda Dantas de Sousa, estudante de Psicologia, Alagoinhas- BA)

            Primeiramente precisamos definir o termo violência. A violência na Análise do Comportamento não é entendida como causada por algo interno no indivíduo; não adota um modelo mecanicista para explicar a violência, como, por exemplo, “Estou com raiva, por isso fico violento”. A violência, para a análise do comportamento é vista como produto de uma interação coercitiva entre o indivíduo e outro indivíduo ou membros da sociedade. É produto de contingências de reforçamento vividas por aquele sujeito que, pode não ter aprendido, nem desenvolvido outro repertório para lidar com frustrações, e, como tal, emite amplas classes de respostas de agressividade, sendo, então, reforçado e positiva e negativamente pelo comportamento violento.

            Podemos exemplificar que o comportamento violento é produto de contingências de reforçamento, ao apontar o exemplo de uma criança que viveu sob contingências coercitivas na infância, ou seja, recebeu muita punição positiva e negativa por algumas travessuras ou alguns comportamentos indesejados pelos pais. Essas punições dadas pelos pais são, geralmente, reforçadas pela sociedade, que diz que devemos educar bem os filhos e para isso “umas tapinhas são necessários”. Supomos que a criança teve este e outros modelos parecidos de interação e, portanto, não desenvolveu outro repertório, ou seja, comportamentos alternativos para lidar com situações parecidas. Tal criança, já adulta, como conseqüência da história de contingências a que foi exposta pode estar replicando o modelo do pai, pois, em curto prazo, a punição funciona: o pai consegue fazer com que o comportamento indesejado do filho pare (reforçamento negativo), e é reforçado pela sociedade, que diz que ele é um bom pai por repreender o filho, pois assim está lhe dando educação e limites (reforçamento positivo).

            Lembramos que a punição, tanto positiva quanto negativa, funciona apenas momentaneamente. Não é a forma mais indicada para reduzir comportamentos indesejados pelos efeitos colaterais e sentimentos negativos que produzem no indivíduo, além de não instalar comportamento novo, desejado.

            Tal modelo de interação é comumente reforçado pela sociedade, sendo assim considero importante definir cultura. A cultura é um conjunto de contingências de reforço social que gera e mantêm os comportamentos dos indivíduos de um grupo e suas práticas culturais, esses comportamentos são passados através das gerações e mantidos pelo reforço da sociedade. Em geral, a transmissão de repertórios comportamentais, a qual ocorre por processos de imitação, instrução e regras, se mantém dentro de contexto pouco crítico e, como tal, se repete com pequena variabilidade.  Segundo Mattaini (1996), o comportamento violento deve ser analisado como uma prática cultural composta por contingências entrelaçadas. O comportamento violento é uma pratica em nossa cultura e sociedade: aprendemos  através de modelos e instrução a emitir o comportamento violento, o qual é mantido pela cultura através de reforçamento positivo e negativo.

   É necessário deixar claro que a agressão não se instala na relação repentinamente. O comportamento violento surge, inicialmente, de forma mais amena, podendo começar, simplesmente, com um tom de voz alterado. E, dependendo das contingências de reforçamento operando na vida daquele indivíduo, vai aumentando seu nível e intensidade gradativamente até chegar a uma agressão verbal ou física. Há reforçamento diferencial da intensidade dos comportamentos agressivos e fading in da intensidade dos eventos aversivos.  Devido ao fato de o comportamento violento ir aparecendo de forma gradual na relação, torna-se difícil a discriminação do processo comportamental em desenvolvimento e não surgem de inicio comportamentos de contra controle por parte da vítima.

            Feitas as definições necessárias, vamos ao questionamento: O que leva um indivíduo a permanecer em uma relação violenta?

            Levantemos algumas hipóteses.

          A – Após o comportamento violento, o agressor demonstra estar arrependido, mais calmo, pede para que a vítima volte, para que fique com ele, e faz algumas promessas de melhora. Junto às promessas vêm flores, carinho, etc. A vítima afastada do parceiro, possivelmente, encontra-se em estado de privação de carinho, afeto, entre outros, e por conta disso pode aceitar as desculpas do parceiro reatando o relacionamento. Após a reconciliação o parceiro pode se engajar em comportamentos compensatórios na tentativa de melhorar o relacionamento: dar presentes, se comportar de forma mais carinhosa etc. Esses comportamentos do parceiro possivelmente têm função reforçadora para a vítima, pois, aparentemente, podem demonstrar que houve a mudança ou melhora prometida pelo parceiro.

            B – O agressor diz a vitima que esta só obterá apoio financeiro e emocional caso permaneça na relação. Neste caso, a vítima permaneceria na relação por reforçamento negativo, ou seja, para se esquivar ou fugir da perda de bens importantes, dinheiro, amigos, status, julgamento social, ou até mesmo para fugir de uma agressão maior.

            C – Diante de um comportamento violento há a ruptura da relação e alguns comportamentos da vítima podem entrar em extinção, pois os reforçadores específicos relacionados ao agressor, que mantinham estes comportamentos, não estão mais disponíveis, e a privação desses reforços pode controlar a resposta de voltar para a relação anterior (mesmo que violenta). Ou seja, a vítima pode ter falta de habilidade para sair do relacionamento violento com êxito, por déficit de relacionamentos alternativos.

            A partir das hipóteses levantadas, podemos pensar sobre alguns pontos que podem levar a mulher vítima de violência a retirar a queixa após ter feito o boletim de ocorrência.

            Primeiramente, quando o boletim de ocorrência é feito, o valor aversivo da agressão está exercendo forte controle sobre os comportamentos da vítima, pois geralmente é feito logo após a agressão. Passados alguns dias tal valor aversivo já está amenizado e a vítima começa a entrar em contato com outras contingências, como a perda de reforços positivos e contato com novos reforços negativos. Algumas vezes precisa mudar de casa, não têm mais acesso a alguns amigos, bens, além do afeto, carinho e atenção por parte do agressor, que geralmente é uma das principais fontes de reforços da vítima.

            O comportamento violento pode aparecer pelo déficit comportamental frequentemente descrito na literatura para descrever algumas características do agressor. Entretanto, também pode haver um déficit comportamental das vitimas para saírem da relação violenta e buscar novos reforços advindos de outros agentes ou ambientes.

            Aliado a esses pontos vêm a desaprovação social e cultural impostos à vítima que tem que enfrentar familiares e amigos que nem sempre apóiam o rompimento da relação. Caso a vítima tenha uma forte crença religiosa fica ainda mais difícil manter o rompimento, e, muitas vezes, a reconciliação é reforçada socialmente, pois “todos merecem mais uma tentativa”, pela comunidade religiosa.

            Observamos que se mantendo na relação violenta, a vítima está exposta a contingências aversivas, porém, rompendo o relacionamento a vítima foge desses aversivos e entra em contato com outros, relacionados às perdas financeiras e afetivas advindas do rompimento. Por ultimo, é interessante atentarmos para o fato de que a vítima repudia o comportamento violento, não o parceiro em si, pois este também é uma fonte de reforços importantes.

            Seria útil você ler o experimento de Azrin, N. H. (1959). Punishment and Recovery during Fixed-Ratio Performance. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 2, 301-305. No qual há importantes informações sobre as variáveis que controlam comportamento influenciado por eventos reforçadores positivos e negativos.


 

Patrícia Panho Ferronato
CRP: 06/99821
Atende no ITCR-Campinas
Cursando Especialização em Terapia por Contingências de Reforçamento - TCR
 

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Frase da Vez

Evite punição: ela não instala comportamentos desejados e gera sentimentos aversivos, tais como: raiva, agressividade, medo, depressão, ansiedade, angústia, insegurança, baixa autoestima etc. Produz também sentimento de culpa no agente da punição. (Hélio Guilhardi)

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Instituto de Terapia por Contingências de Reforçamento

Rua Josefina Sarmento, 395, Cambuí - Campinas - SP
Fones: (19) 3294-1960/ 3294-8544
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